Eu consigo passar horas sem fim a observar a vida selvagem ao vivo.
Ainda hoje não sei explicar porquê. Numa visita a qualquer reserva
eu sou o “chato” do grupo que observa as pistas, os pequenos
animais, os cocós, os trilhos (vazios), a vegetação.
Uma vez em pleno
Kruger estacionei o carro aleatoriamente e desliguei o motor, à
espera do que pudesse vir a acontecer. A paisagem era savana seca,
extensa, sem qualquer sinal de seres vivos. A Yumi, naturalmente,
olhou para mim de lado e perguntou: “A sério? Aqui? Porquê?”. O
engraçado é que a resposta apareceu de imediato, emergindo do meio
do capim, uma chita a perseguir uma gazela, em cena “National
Geographic”. Não tive nem tempo de responder à Yumi, nem de
fotografar. Confiei a recordação na minha memória.
Para mim, a vida
selvagem é o puro exemplo de vida, de existência, com inúmeras
analogias à vida humana. Só que nós complicamos muito.
Desta vez o passeio foi na reserva especial de Maputo.
Ao chegar ao terreno do visitado sentimos bem a sensação de
visitante, com olhares a estranharem cápsulas metálicas fumegantes
com animais de cheiros estranhos no interior.
O elefante, uma atracção especial da reserva, é o tipo de animal
que só quer paz e comer. Tolera visitantes até abanar as orelhas ou
raspar o chão com uma das patas dianteiras. Aí sabemos que estamos
a perturbar alguma coisa. Melhor sair.
Especial atenção se há crias por perto. Um elefante destes em
fúria vira um carro…
A pacífica girafa é desengonsada, elegante, com padrão de pele
único, pescoço desproporcional e lingua feia. Ao atravessar a
estrada faz várias paragens a olhar para nós, anunciando a sua
passagem (ou precavendo-se de alguma fuga necessária). Uma linguagem
silenciosa, mas suficiente.
O nome de “boi-cavalo” carcateriza bem este animal, misto entre
boi, com seus cornos e cavalo, com a destreza no trote. Quer paz, mas
se muito incomodado vira besta, besta selvagem (do nome em Inglês,
wild-beast).
Os “cavalos de pijama” são absolutamente pacíficos...até a
irritação alheia exigir um coice. São, por natureza presas, mas
com técnica apurada de confundir os predadores. Se as zebras se
juntarem, o potencial atacante fica baralhado com a mancha do padrão
preto e branco e não distingue facilmente uma presa solitária para
atacar. Inteligência de grupo...
O pachurrento, mas traiçoeiro hipopótamo. Tem fama de ser o animal
mais perigoso de África, o pacífico herbívoro. Uma boa prática é manter-nos fora do caminho deste gordinho fofinho de centenas de quilos.
De surpresa apanham-se alguns animais que entre o receio e a
curiosidade ficam estáticos a olhar para nós, de câmara em punho.
Se ficarmos algum (demasiado) tempo, invariavelmente esta bicharada
dispersa para as suas vidas.
Uma lição de física e sobrevivência aparece quando vemos este
pássaros amarelos. Fazem os seus ninhos no topo de longas e finas
ervas, fazendo-nos desconfiar da estabilidade e durabilidade das suas
casas. Mas olhando para o solo de onde nascem essas ervas, vemos
pântano, certamente povoado por diversos predadores de pássaros. Aí
compreendemos a escolha do local para fazer o ninho e deliciamo-nos
com o chilrear da azáfama diária.
No acampamento, já fora das cápsulas metálicas que nos levaram até
ali, é a vez de ver os animais mais pequenos. Alguns deles nunca
dantes vistos. Outros desejando nunca mais ver...
Osgas camufladas
Sapos psicadélicos. Alguns deles encontramos e depedimo-nos deles na
mesma posição, indeferentes a nós, a caçar mosquitos.
Quando a Yumi disse “está aqui um carangueijo preto”, eu
desconfiei. Nunca, na TV ou em leituras, vi um caragueijo preto. Ao
tentar pensar o que poderia ser tal espécie só me ocorreu uma:
escorpião! O que se veio rapidamente a verificar...uma escorpião do
tamanho duma mão que só tinha visto na televisão. Com aquelas
pinças entendi a semelhança ao carangueijo, mas aquela cauda,
aquela cauda...inconfundível...
São vários os bichinhos que desconheço. E quando assim é, sigo a
máxima “não sabes o que é, não mexe”, mesmo tentando não
mexer nos que conheço, para não perturbar o eco-equilíbrio. Este
era uma espécie de barata corpolenta ou camarão com pernas…
Como estamos no verão, é altura de todos os bichos sairem da
hibernação. Incluindo este exemplar que, confesso, representa o meu
kryptonite.
Lindas, elegantes, silenciosas...por
vezes dolorosas e eventualmente mortíferas. Esta verdinha caiu dum
tronco quando estávamos perto. Penso que a minha reacção com
cobras é a minha salvação. Fiquei absolutamente congelado, a mexer
apenas os olhos para ver onde a cobra ia depois de tocar no chão.
Tão assustada como nós, zarpou na direcção oposta num zigue-zague
sensual e brilhante.
Indo
para a praia...o que pode acontecer?
Pode
o mar estar repleto de alforrecas “garrafas-azuis” ou “caravela
portuguesa” (curioso nome este, hã?). Ondulando ao ritmo da maré,
navegam pacificamente nas suas vidas. Acho-as lindas, com cores
fortes, corpo transparente e
tentáculos...bem cuidado com os tentáculos. Praticamente
transparentes quando estão dentro de água, apenas sentimos
a passagem duma “faca” quando nos toca. A irritação pode, no
entanto, sair facilmente com chichi, limão ou vinagre. Escolha a da
sua preferência ou conveniência.
Como
a maré estava favorável para as alforrecas (noutras marés e
noutros ventos elas desaparecem) deliciamo-nos com a piscina...
...e
da piscina podemos apreciar os golfinhos saltitões, cujo dorso
brincalhão se distingue do dorso estável e ziguezagueante do
tubarão.
A escola foi boa para os miúdos. Há uns dias o Leo viu uma Maria
Café de pernas laranja. Parou, apontou o dedo e perguntou “esta é
venenosa papá?”. Não era, mas fiquei muito feliz pelo nível de
alerta e relatividade que desenvolveu...
A semelhança com a vida humana deixo-a à vossa análise.