24 de março de 2021

Gorongosa 2000

Em 2000, tinha eu 19 anos, fiz a minha primeira visita a África, entrando pela porta de Moçambique. A viagem prometia, no mínimo, ser inesquecível, mas acabou mesmo por ser decisiva quanto ao meu destino.

O plano era percorrer o máximo possível por estrada e ir a locais onde a palavra “turismo” há muito não entrava.


Um desses locais foi o Parque Nacional da Gorongosa.


Nessa altura a guerra civil tinha acabado há 8 anos, e a sua ressaca ainda se fazia sentir por toda a parte. Lembro-me de ver equipas de desminagem ao longo da estrada, com fitas a assinalar locais perigosos, tentando remover o máximo de explosivos possível.

Era frequente ver as infraestruturas remendadas, provavelmente uma melhoria da situação anterior, onde nalgumas pontes, simplesmente não se passava.



Havia um procedimento na passagem destes remendos. Tínhamos que verificar a condição das tábuas, não fosse o tempo apodrece-las e termos um alçapão a meio da travessia.

Na zona da Gorongosa, por ser quartel-general da RENAMO, a caça furtiva e as minas tinha dizimado a bicharada para números perto duma paisagem desértica (censos de 1994), situação inglória para tão luxuriante vegetação.



Assustados, os animais eram difíceis de avistar em 2000. Era necessário ter uma objectiva com um zoom generoso e ter paciência para fazer o registo fotográfico.



O parque tinha os alojamentos improvisados, mas um luxo naquele cenário: havia tecto e paredes para dormir em colchões, ou camas de campanha colocados no chão. 



A água de lavar os dentes vinha de origem desconhecida, mas com selo de confiança: parecia Coca-Cola e aconselhavam a não beber. Instrução que rapidamente percebi e acatei.



O parque estava devastado pela guerra. Eram muitos os sinais de que aquele local tinha servido para diversas finalidades, mas nenhuma relacionada com safaris.



A piscina do alojamento era casa duma iguana.



Melhorou consideravelmente em 2009, numa nova visita que fiz.



O parque em 2000 já tinha carros de safari para turistas, mesmo que estes fossem escassos. Uma ou outra vez tínhamos que parar para tratar de alguma avaria, havendo escalas entre nós. Uns olhavam para o motor, outros vigiavam os animais e eu tirava fotografias! 



A outra opção eram o UNIMOG, um verdadeiro animal mecânico do todo-o-terreno. Permitia-nos dar uns belos passeios onde havia estradas e onde não as havia.




Curiosamente, foi neste horizonte da Gorongosa que, fazendo uso da minha recente maioridade, decidi que o meu destino passaria por África. A minha única dúvida era se ficaria desde já instalado ou se regressaria a Portugal para acabar os estudos. Sendo assim, se o tal “bichinho de África” existe, aquele que me picou em 2000 mora na Gorongosa.



Hoje é incrível ver a transformação que o parque levou, em apenas 21 anos…

O projecto em curso é de fazer brilhar os olhos, onde se respeitam pessoas, animais, crenças, ciência e economia. 

Quando vi a Gorongosa num artigo da National Geographic em Maio de 2019, li de uma assentada e fico emocionado por ver o parque a evoluir tão bem!