3 de julho de 2018

Um estranho em Hyenpung


Hyenpung é a zona da Coreia onde morámos durante quase 6 meses.





Zona nova, a 20 minutos da cidade de Daegu, urbanizada e pensada a régua e esquadro. Por vezes pensava que a zona tinha sido desenhada por um especialista no famoso jogo SIMCITY. Nem a floresta de edifícios de 20 andares me chocavam. A Coreia tem um pouco mais de área que Portugal, mas quase 51 milhões de habitantes. Ou seja, uma densidade populacional bastante maior que em Portugal. Assim, se alojarmos as pessoas na vertical, há mais espaço na horizontal para a circulação, espaços de lazer, zonas comerciais, passeios nas montanhas, etc…



O estranho fui eu, que em quase 6 meses, os estrangeiros que vi não me encheram os dedos duma mão. Ser estrangeiro em Hyeonpung é quase como ser uma celebridade. A grande diferença é que nunca ninguém me pediu um autógrafo ou quis tirar uma selfie comigo.

Ao apanhar o autocarro em Daegu para Hyenpung o motorista bloqueia a minha entrada. Com um ar muito admirado e tenso diz-me para não entrar, pois o autocarro vai para Hyenpung. Dá ideia que irei passar uma barreira proibida aos estrangeiros, ou talvez ele tenha medo que me tenha metido num autocarro por engano. Digo-lhe que sim, o meu destino é Hyenpung. Ele cede e deixa-me entrar, mas abana a cabeça, como se eu estivesse prestes a fazer um erro grave.

As crianças perdem a postura que as levava pacatamente para casa. Fazem sinais nervosos, chamando a atenção aos amigos para o “fenómeno”. Os sinais são universais, de maneira que quando dão as primeiras pancadas nas costas dos amigos, já eu me rio por dentro. Olham esbugalhados, incrédulos, pois as personagens dos livros da escola, que dão conta de outros países e culturas são uma realidade. Parece que saí das páginas dos estudos e deambulo como exemplar vivo do Ocidente.

Algumas crianças mais velhas tentam o diálogo em Inglês, tímidos. Ouve-se o clássico “Hello” ao que eu costumava responder “ Hello, how are you?”. Frase que os deixava logo sem fala. Não porque não saibam mais, mas parecia-me que não esperavam resposta e, surpreendidos, fugiam.

Os adultos não costumavam ligar muito. Um sorriso, algumas palavras de Inglês, às quais eu tentava responder no meu mau Coreano, eram suficientes para partilhar cordialidade.

Os mais idosos é que reparavam e muito. As avós não se continham quando me viam com a família. Ao olharem para a Bia exclamavam “mas que menina tão linda, muito parecida com o pai”. Uma observação deveras apropriada para se dizer…em frente à mãe!

Os avôs olhavam fixamente com um espanto congelado no rosto. Os que conseguiam arriscar algum inglês, com um sotaque nem sempre perceptível, diziam: “where?”, “country?”, “from?”, uma palavra que procurava satisfazer a enorme curiosidade de saber de onde vinha este Ocidental. “Portugal”, dizia eu. “Aahh”, obtinha quase sempre como resposta. Um “aahh” que podia significar muita coisa, como “longe”, ou “não faço a mínima ideia onde fica”, ou “isso é um país?”. Mas um “aahh” que encerrava a conversa, pois nem o inglês deles, nem o meu coreano dava para maiores desenvolvimentos. Acabava o curto diálogo com o meu melhor sorriso.