2 de março de 2015

A porta 4

Numa instituição pública em Maputo.

A fila faz-se em largura, à medida do balcão, mas as pessoas para atender são escassas! De maneira que se vai ganhando posição à força de cotovelos, para sermos atendidos por um(a) funcionário(a). Mas ele(a) não parece estar muito sintonizado com o que dizemos, evitando o contacto visual e distraindo-se facilmente. Preparamos o discurso para ser objectivo mas ao fim de 3 palavras ele(a) tem que atender uma chamada, ou é interrompido(a) por um(a) colega. O discurso longo não resulta! Opta-se por um discurso mais curto, tipo telegrama, procurando sintetizar tudo o que se quer dizer em palavras-chaves. A mensagem chega, mas a solução nem sempre...

Se o caso é rotineiro, não há crise. O problema chega quando o caso foge um pouco da linha ou tem trâmites diferentes do habitual. Tal como na rábula “Papel, qual papel” dos Gatos Fedorentos, a dança do processo pode levar...dias, semanas! Prepara-se toda a documentação que nos foi pedida…mas quando se entrega falta um papel, ou em vez da cópia X, afinal é preciso o certificado Y. É comum, ao fim de algumas tentativas, ouvir-se “Vá falar com fulano tal...”. Facto que traz nova bolha de oxigénio e esperança de ver o caso resolvido, pois no balcão a coisa não anda. A personalização do serviço obriga a ficar ligado a essa pessoa, tendo frequentemente os seus contactos pessoais de telefone.

Muitas vezes não é fácil, seja porque é um caso raro, seja pela demora que já leva, seja porque a pessoa que assina está ausente, o que carimba não está ou o que entrega está reunido! São justificações que já se conhecem e de certa maneira conforta pela normalidade. Pior seria ouvir “isto não se pode resolver”, ou pelo contrário “isto vai-se resolver num ápice, esteja descansado”. Aí seria logo de desconfiar e pensar que não se é levado a sério! Estaria derrotado à partida. Quando se ouve “volte amanhã”, por vezes é um alívio. Naquele dia as energias estavam mesmo a esgotar-se e o voltar amanhã reconforta, pois no dia seguinte é que é. Voltaremos frescos e com sorriso renovado, embora sustentado por uma fraca crença. E no dia seguinte repete-se o mesmo: pessoa x, documento y, volte amanhã…ou volte daí a 3 dias!

Nalgum momento tem que se levantar a voz e mencionar as voltas dadas, tempo gasto e o processo que continua por resolver! Embora seja diferente de pessoa para pessoa, há um limite para todos…e acaba-se por atingi-lo! Eis que ao final de alguns dias se ouve: “Vá à porta 4”. Renasce a esperança e “agora é que é!” volta a ser o pensamento que nos assalta a cabeça com muito mais força. Acha-se que finalmente ter-se-á o tratamento digno que se merece, ir-se-á a um gabinete com ar condicionado, um quadro senior pronto a escutar e dar a chave do problema com a calma que o tempo de experiência lhe deu. Acelera-se o passo, pergunta-se, sem parar, onde fica a tal porta e galgam-se degraus dois a dois.


Mas a porta 4 está sempre fechada, e olhem que já lá fui meia dúzia de vezes! Será uma forma de nos mandar à merda, sem o dizer abertamente? 


A verdade é que mais ou menos difícil, com mais ou menos tempo, a coisa acaba por se resolver. Depois de tanto impasse, acreditem que ficamos aliviados, não esquecendo o percurso mas colocando essas memórias em stand by, até à próxima visita...