19 de junho de 2010

Fenómeno SPORTING


Moçambique tem um campeonato de futebol que se chama Moçambola. Tem 14 equipas e joga-se ao longo do vasto país. Os Moçambicanos, além da adoração clássica, por jogadores e equipas internacionais de topo, seguem o campeonato português. E quando digo seguem, fazem-no a sério. Sabem os pontos das equipas da frente, as ginásticas mentais de vitórias para uma equipa ser campeã e têm ídolos, geralmente de um dos 3 grandes. Aos Domingos ouvem o relato enchendo as ruas das cidades Moçambicanas de jogadas e emoções…do campeonato português!!

Quando o Benfica foi campeão, eu estava em Maputo. Obviamente que recolhi a casa, por não se tratar duma festa com as minhas cores, mas não deixei de ouvir (porque não tinha grande remédio) a festa na rua. Buzinas, cânticos, cachecóis e camisolas. Imagino a perplexidade de um estrangeiro que pergunte: “houve campeão em Moçambique?” e obtenha a resposta: “não…isto é por causa do campeonato de Portugal”…depois de fazer as contas à distância.

Em Cabo Delgado o fenómeno continuou, com uma vantagem. A febre do campeonato português parece ter uma só cor predominante, o verde e branco!! Já vi todo o tipo de acessórios do SPORTING. É incrível. Novo e velho símbolo e, quando menos esperamos uma camisola, um porta-chaves, um poster, um autocolante, uma parede pintada, etc… Ainda não encontrei uma justificação para o fenómeno mas, sinceramente, nem procuro saber. Só me apetece cantar com a “curva”:


Eu ando sempre atrás de ti

Onde tu fores eu vou lá estar

Só pra te ver…

Pra te ver ganhar



Novo símbolo num autocolante

Casa pintada...com novo símbolo...e patrocinadores!!

Clássico emblema, num clássico local

Numa aldeia no interior de Cabo Delgado...uma camisola rasgada, suja, mas do SPORTING!

Poster antigo, mas um enquadramento delicioso: cerveja SPORTING e preservativo Jeito.

O Sporting deveria estudar a hipótese de um estágio aqui. Seria como estar em casa, a milhares de quilómetros de distância de Alvalade…


11 de junho de 2010

Maningue nice

Em Moçambique a língua oficial é o português. É ensinada nas escolas e todos os documentos, jornais e televisão a usam. À parte disso existem variadíssimos dialectos pelo país inteiro. São ensinados maioritariamente no seio familiar, pela fala, porque a escrita, muitas vezes, fica esquecida. Digo isto porque eu próprio estou a aprender algumas palavras de Macua (dialecto do norte) e as pessoas têm dificuldade em me dizer como se escreve. Vou lá pela sonoridade. Mas os dialectos persistem, como parte da identidade nacional e distinguido as várias origens, dentro deste enorme país. Persistem e insistem em ocupar o vocábulo aqui usado. Outros exemplos são: machamba (pequena horta); cocuana (pessoas mais velha); machibombo (autocarro).

A esta distância, durante todos estes anos, é normal que o português comece a perder alguma força. Não é esquecida, nem são esquecidas algumas referências a Portugal, mas a língua parece começar a perder força, ou a ganhar transformações. A presença forte da desenvolvida África do Sul introduz, e muito, a necessidade de comunicar em Inglês. O natural nacionalismo e orgulho de cada Moçambicano não deixa morrer os dialectos. E é esta mistura que está, a meu ver, a mudar a linguagem no país. Eu arriscaria a dizer que em breve surgirá um dialecto próprio, bebendo inspiração nesta confusão linguística e histórica! Não se riam…lembram-se do “bué”? Eu era quase proibido de o dizer, porque não era linguagem nenhuma. E agora…vem no dicionário português!

Ora vejamos:

O título deste post é “maningue nice” que, qualquer moçambicano ou pessoa que cá esteja há uns dias sabe o que significa: “muito bom”. Mas “maningue nice” não tem nada de português. Vai beber inspiração a dois locais distintos: o maningue deriva de um dos dialectos do centro do país que usa esta palavra para dizer “muito” e o nice vem, naturalmente, do Inglês.

E é o Inglês que tem tido mais força na mudança de linguagem. Não sei se invadindo ou se sendo facilmente adoptado, mas os termos Ingleses têm sido usados duma forma peculiar salpicando as frases com base portuguesa.

Facilmente ouvem-se frases como:

· - Numa well a curtir a life;

· - To busy no meu office;

· - Logo dá-me um call para o meu phone;

· - Carro com sun roof e bancos em leather.

Mas até aqui estamos no campo dos estrangeirismos, é certo que num campo lamacento de abusos de estrangeirismos, mas…quem não os usa? Agora, há quem os use, há quem deles abuse e ainda quem os transforme. Há frases em que, depois de as ouvirmos, temos que parar para traduzir mentalmente, reorganizar a frase e depois responder. Por isso, o nascimento do dialecto que eu antevejo é a transformação desses termos com base na gramática portuguesa. Que origina algo engraçado, como podem ver na amostra de “dicionário” que se segue:

Exemplos

Ø DJOBAR: trabalhar (adaptando o verbo Job à construção de um verbo)

Ø Vamos playar ali: vamos jogar ali

Ø Faita : luta

Ø TEM BRÓ, BRADA: amigo

Ø BIGUE : musculoso

Como vêem, já há uma espécie de tradução, o que implica que já se assume a existência uma língua! Agora digamos, nesta linguagem: “o teu amigo está muito musculado e luta bem”: O teu brada tá maningue bigue e faita well.

Leiam em voz alta, digam-no a alguém que estiver ao vosso lado…não tem já contornos próprios de dialecto?


6 de junho de 2010

Afinal, trabalho...


Serve o presente post para deixar descansados aqueles que pensam que eu só vim para Moçambique de férias. Além do trabalho de escritório, que não tem muito de Tertuliante e não é nenhuma novidade, envio fotos da primeira deslocação ao terreno, com o objectivo de fiscalizar a ocupação de terras. O destino foi o distrito de Montepuez.

Estradas tão estreitas que só com imaginação e alguma sorte o condutor consegue passar.

Pontes improvisadas, mas que fazem na plenitude a sua função.

Escutar as pessoas, dizendo que lhes roubaram dezenas de hectares (ouviram bem...DEZENAS!) e saber das suas culturas.

Desenvolvimento dos mapas existentes, acrescentando locais. Junto da população perguntamos: "Como se chama este local?". Tiramos um ponto GPS e registamos...

Com pouco locais onde comer, abastecemos numa aldeia com uma deliciosa cana de açucar. Aqui tive 3 pedidos de casamento. Todas queriam casar com o branco! Tive que recusar...não tínhamos espaço no carro.

Reuniões formais, em ambiente informal. Galinhas, cães, bois, cobras...tudo convive ali...