17 de outubro de 2016

É di mim...

A Bia é bilingue. Recebe o português do pai e o coreano da mãe. Acrescido a isto, ouve o inglês entre pai e mãe. Isto faz dela trilingue aos 2 anos, pelo menos na forma oral.

Quando viemos para a Boa Vista, Cabo Verde, andamos à procura de infantário para a Bia. Estávamos à procura, tal como em Maputo, dum infantário onde se falasse português. Nenhum dos locais nos satisfez e foi quando em conversa percebemos que havia uma escola da qual davam boas referências: escola francesa. Visitamos e gostamos. A nossa única preocupação foi a língua! Tínhamos receio de que na cabeça da Bia houvesse demasiadas línguas. Das preocupações de pais de primeira viagem está o receio que com tanta língua ela baralhe tudo, demore a falar e quando o fizer poderá resultar num retalho onde precisaremos de dicionário familiar. O director da escola garantiu-nos que na idade da Bia as professoras não falam francês. Só o fazem a partir dos 3 anos. Decidimos ficar.

Não demorou muito tempo para perceber que as professoras falavam com ela em crioulo! As professoras, em bom português garantiram-me que a Bia já entendia crioulo. As nossas preocupações voltaram: não estaremos a abusar com tanta língua?

Um belo dia, quando a apanho na escola, ela senta-se no carro, agarra a mochila dela e diz: “é di mim”. Na dúvida, porque por estas alturas ela já vai dizendo umas palavras de português e coreano, perguntei-lhe: “é o quê?”. Ela olhou para mim, ainda agarrada à mochila, com ar de espanto de quem analisa a senilidade do pai. Repetiu: “é di mim” e olhou pela janela, encerrando naturalmente a conversa.

Noutro dia, na praia, apontou com firmeza para alguém na zona do restaurante. Dum grupo variado de pessoas, o dedinho dela foi cirúrgico a apontar e ela disse: “Bonju”! Estava a falar da professora de francês dos mais velhos que cumprimenta com um efusivo “Bonjour” todas as crianças pela manhã.


Será este o momento em que a minha filha me ensina que é muito mais flexível do que eu suponha? A minha ignorante atitude de a “proteger” das diversas línguas caiu por terra. Na minha cabeça o disjuntor disparou. É muito melhor ter diversidade nesta idade (e em todas, a bem da verdade) mesmo que atrase a fala. E mesmo que atrase a fala, falamos de quê?...2 meses?....6 meses? Que diferença faz, se depois de começar a falar teremos uma intérprete inter continental?