Quando foi reportada a primeira situação achámos que era teimosia de uma pessoa, um caso isolado, sem muito significado.
Estávamos
a fazer o cadastro de terras na zona de Monapo, província de Nampula e, com o
decorrer do tempo, as equipas de campo começaram a reportar mais casos. Começou-se
a identificar um padrão e o mistério estava lançado.
Ao
fazer o inquérito dos titulares ou ocupantes das terras, as mulheres diziam
desconhecer o nome dos homens, dos seus próprios maridos!
As
circunstâncias eram dignas de um filme policial, pois a forma como as mulheres
nos diziam que não sabiam do nome dos maridos era, no mínimo, suspeita. Os
diálogos eram deste tipo:
Inquiridor: nome do
seu marido?
Inquirida: não sei,
não me lembro.
Inquiridor: mas é
seu marido?
Inquirida: Sim,
sim, casados há 15 anos.
Inquiridor: …e não
se lembra do nome?
Inquirida: Não. –
mas este "não" vinha tão firme e seco,
sem qualquer explicação, que não restavam muitas pistas por onde explorar o
fenómeno. Era estranho, sem dúvida, mas parecia um normal muito óbvio naquela
zona que ninguém, além de nós, questionava.
Inquiridor: e como podemos saber o nome do seu marido?
Inquirida: tomem
aqui o BI dele. – com o BI do marido na mão, ela poderia ditar-nos o nome,
naturalmente, mas ao não fazê-lo, cimentou o mistério.
Havia
informação em falta nos processos de cadastro porque algumas equipas não
conseguiam de forma nenhuma recolher o nome do marido. A naturalidade deste
comportamento baralhou as nossas equipas. Algumas nem ousavam explorar mais o
mistério, por temerem ofender aquilo que parecia uma regra estabelecida. Há casos
mais normais de esquecimento dos inquiridos, como por exemplo datas de
nascimento, números de telefone, etc…mas não se lembrar do nome do marido com
quem se está a viver, mesmo que há uma simples semanita?
Podíamos
até estar perante um problema social, violência doméstica, repressão, enfim…colocaram-se
várias hipóteses para entender o mistério. Todo o cuidado era pouco.
Como
não saía nenhum nome, nem as mulheres cediam um milímetro em direcção a qualquer
justificação do fenómeno, o mistério atingiu o seu auge quando uma inquirida
gritou para dentro de casa: “marido, anda cá dizer o teu nome a esta gente”. Ficou
claro que o caso requeria investigação…
Junto
das lideranças locais, pedimos esclarecimentos sobre o fenómeno e a explicação foi
simples: a crença local era que, quando as mulheres dissessem o nome do marido,
isso traria azar no relacionamento. Ponto final. Simples. Afinal só queriam ser felizes...
Respeitando
a crença local, daí em diante as equipas passaram a actuar com a maior
normalidade perante o fenómeno: “Não sabe o nome do seu marido? Normal…não há
problema. Tem aí à mão o BI dele ou pode chamá-lo?”.
Mistério
resolvido e, que saibamos, não provocamos nenhum divórcio na zona…
3 comentários:
Que história engraçada 😁
�������� pois não....
Realmente há crenças muito engraçadas. Adorei. E já agora, excelente trabalho de investigação :)
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