Nos últimos 26 meses foram muitas as horas que
passei ao volante, saltitando lugares no norte de Moçambique, rumo a locais de
trabalho. Tenho conhecido os vários pós das picadas, aprendido como bailar o
carro nas diferentes lamas, tentado esquivar aos muitos buracos e deliciado com
os quilómetros de bom alcatrão que já se apanham.
Nunca são estradas fáceis,
sempre com muitos obstáculos. Sejam crianças que fazem da estrada a extensão
das suas brincadeiras, sejam cabritos galinhas, ovelhas ou porcos que passeiam
livremente, sejam troncos deixados na estrada em sinal de aviso para uma avaria
mais à frente. A atenção tem que ser a 200% e, claro está, o cansaço no final é
o dobro. Tenho a
sensação de que se voltar a conduzir numa autoestrada sofrerei de tédio e corro
sérios riscos de adormecer!
Nestes últimos 26 meses percorri cerca de 70
mil quilómetros, o que dá uma média diária de 90 Km por dia, TODOS OS DIAS! No
entanto tenho direito a fins-de-semana e mantenho a vida pessoal. Assim,
fintando as estatísticas, posso fazer 700 Km num dia e ficar bem relaxado à
beira mar com uma cerveja na mão noutros dias...
A distância parece assustadora. Daria quase
para dar duas voltas ao mundo pela linha do equador, ou percorrer 28 vezes Portugal,
pela linha de fronteira! Mas a verdade é que o circuito é mais reduzido (cerca
de 3300 Km), não se estende para além do norte de Moçambique e já pouco muda. O
que acontece é que o faço várias vezes, repetindo vários troços.
Considero um número notável, atendendo ao mau
estado geral das estradas e ao aparente bom estado das minhas costas. Também me
considero privilegiado quando chego a casa, me deito no estúdio de massagens da
Yumi e a deixo recolocar no sítio devido as peças, à solta nas minhas costas.
Já vi o nascer do sol em Pemba e o pôr-do-sol
no lago Niassa (não no mesmo dia, embora seja tecnicamente possível). Posso
orgulhar-me de ser o único elemento da equipa que visitou todos os locais ativos
de trabalho e conhece, nem que seja de vista, a maioria das equipas (que já somam
algumas centenas de pessoas).
Em Quelimane realço a arquitetura característica e os arruamentos tão geométricos que até a mim me desorientam! Os mosquitos lá não picam, mordem, ferram com dentes afiados através da roupa.
Em
Monapo vejo o exemplo. Dos 15 locais de trabalho este é o único que continuaria
de forma autónoma se o projeto terminasse hoje. É inacreditável, é triste mas é
assim. Parabéns a Monapo onde a equipa local assumiu os trabalhos como parte
das suas tarefas. Percebeu bem o potencial e importância da iniciativa e hoje
com o mínimo de ajuda são eles que gerem as metas, as equipas, os problemas. Um
exemplo!
Em Malema é a produtividade que contagia.
Terra fértil, regada por inúmeros canais e gente que dedica uma vida à
agricultura, muitas vezes feita com pouco mais que uma enxada. Aqui faz-me mais
sentido do que nunca atribuir o documento que lhes dá segurança da terra.
Em Mocimboa vejo uma preguiça endémica a ser
agitada de forma brusca, acordada a baldes de água fria motivados pela exploração
de gás natural um pouco mais a norte.
Cuamba a mim parece-me um lugarejo encravado
entre o longe e o distante. Cidade onde não se encontra estrada de alcatrão.
Nem lá, nem num raio de 100km, deixando os acessos penosos na época das chuvas.
Tem comboio que traz e leva mercadoria de Nampula, tem produção agrícola sim,
mas a mim parece-me um local esquecido. Talvez não esteja a ser justo, mas é
assim que vejo Cuamba.
A vila de Metangula, à beira do Lago Niassa,
um dos grandes lagos do vale do Rift, é o extremo oeste deste circuito. Pacata,
simples, mas com uma riqueza incalculável: uma reserva gigante de água doce!
Local onde as pessoas levam o gado a beber, onde se lavam, lavam roupa e loiça,
onde se pesca, ou simplesmente se retira água potável para casa.
Em Lichinga é incontornável
falar do frio! Localizada num planalto, a 1300 metros de altitude, obriga o uso
de luvas e casacos fortes nos meses mais frios (meses sem “r”). Como não tenho
nada dessas indumentárias em Pemba, tenho que inventar, sobrepondo camisolas
finas, na esperança que façam uma camada grossa e mantendo as mãos nos bolsos
quando não preciso delas!
De Pemba haveria tanto para falar, mas uma
única coisa realço: se tivesse que escolher um único local, entre estes todos,
para ficar a viver, seria certamente Pemba! Felizmente vivo cá...
Em Mecufi compro peixe fresquíssimo diretamente
das canoas dos pescadores, que regressam nas marés cheias. Além disso a praia
de Mecufi encanta-me, sem motivo...
6 comentários:
Uau...que sítios maravilhosos por onde andas. Por instantes viajei um pouco.
Obrigada
Beijinho
Joana
Que romântico, grande viajante!!!
Bravo bravo bravo
So me ocorre um sentimento: INVEJA
Uma boa descrição e avaliação do trabalho feito e por fazer.
Apreciei especialmente as fotos.
Felicidades
Abraço JP
Eu também viajei. VIVA MONAPO.
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