9 de outubro de 2014

Noites cinzentas

Lembram-se do meu passeio deDomingo há mais de 7 anos atrás? Pois me parece que a cooperação Angola-Moçambique neste capítulo está a dar força aos agentes do lado do Índico. Talvez porque as coisas más se aprendam mais depressa...


De farda cinzenta, andam pelas ruas à noite, em busca de subsídio salarial. Lanterna improvisada com o telemóvel, mandam parar indiscriminadamente. Se andassem à pesca seriam daqueles pescadores sem escrúpulos, que lançam dinamite nas águas, com certeza de que tudo será apanhado, sem distinção de espécies nem preservação do ambiente.

A apresentação é fraca e a mistura explosiva: muitas vezes cheiram a álcool ou já lutam com a língua, que teima em enrolar, para poder falar; arma a tiracolo e formação cívica baixa. Enquanto discutem connosco a arma vai dançando nos seus ombros, desviando a nossa atenção para o potencial perigo. As armas estão enferrujadas e não é preciso perceber muito de material bélico para perceber que são modelos antigos, mas apesar disso, não quero nem suspeitar nem ter provas de que a arma não funciona. A formação cívica, na maioria das vezes não nos deixa ter uma troca de argumentos capazes. As discussões tendem para a teimosia policial, pois se eles dizem algo, pouco nos resta para contra argumentar.


Mas nem tudo é mau, tenho que admitir. Têm capacidades teatrais fora de série. Combinando uns com os outros, vão elevando a seriedade do assunto, à medida que chamam o seu “superior”, que vem com ar sério, pouca vontade de ouvir, com a palavra “esquadra” debaixo da língua e às vezes de algemas já na mão.
Exploram também técnicas de intimidação, para ter uma base de estudo do condutor. Se este abanar ou ceder, vão por um caminho. Se não, jogam outras cartadas:

“a andar na rua tão tarde?”. Como ainda não há recolher obrigatório em Maputo, esta pergunta não tem razão de existir pois, que eu saiba, não há limite de hora para andar na rua

“porque é que é a sua esposa a guardar os seus documentos?”. Técnica básica para amedrontar.

“não saber também dá multa...”. O não cumprir dá de facto multa, independentemente de a pessoa ter conhecimento prévio da infracção ou não. Agora reparem, o simples facto de “não saber” também, dizem eles, dá multa. E não hesitam em evocar o artigo da lei e a quantia da multa, tentando dar credibilidade ao disparate!


Multas tudo bem, e eu próprio já tenho uma colecção delas (todas de excesso de velocidade). Mas com razão! Pois o ridículo chega quando concordamos em pagar a multa, seja porque de facto a polícia tem razão, ou porque desistimos de discutir. É que estes polícias de farda cinzenta não têm qualquer instrumento de autuação: nem livro de multas, nem balão de controlo de álcool. Ou seja, não nos podem multar, mas também não tiram os nossos documentos do bolso deles. Ali ficamos a olhar uns para os outros. Fica a estranha sensação de como é que a discussão se vai arrastando, recorrendo muitas vezes à ameaça, se no fim nem uma multa podem passar. Mas é surpreendente com esta estranheza se dissolve num sentimento banal.

Já há quem adopte várias estratégias para evitar este cinema ao ar livre nas noites das ruas de Maputo. Há quem só saia de táxi, mas até aí a polícia é assertiva, mandando parar o táxi e, sem sequer uma boa noite ao condutor, já nos está a pedir a documentação pessoal. Há quem planeie as rotas passando apenas pelas ruas principais, pois a probabilidade da polícia lá estar é menor, claro!
Eu sei que o salário dos polícias deve ser irrisório e que, aqueles agentes de segurança nacional, escondem uma vida social com grandes dificuldades, mas não me parece justo que o cidadão tenha que pagar por isso de forma tão directa!

A distorção provocada por estes episódios é tal que, aquando da minha última viagem à Etiópia, percebi como a polícia, no geral tem má conotação na minha cabeça. Estava dentro de um táxi e quando vi polícia mais à frente na estrada exclamei para o taxista “Bolas, policia, estamos lixados!”. O taxista olha para mim de soslaio, espantado com a minha frase e responde “lixados? Porquê? A policia anda nas ruas para controlar o trânsito.

Obrigado Sr. Taxista, por me lembrar da função base dos policias...quase me tinha esquecido!

4 comentários:

macaca grava-por-cima disse...

o taxista etíope deve ter pensado que transportava um furagido!!! AAHAHAHAHAHAH

Cristina Rodrigues disse...

Isso é assustador....

Joana disse...

epá... que notícias cinzentas.

Sara disse...

Pois!!!!! Um caneco!