Ao olhar para uma mesa de
refeição Coreana o espanto é enorme! Pouca semelhança tem com a disposição da
refeição ocidental e damos por nós a pensar: “como se come isto tudo?”, ou “por
onde se começa?”.
Este texto serve de guia para não se passar fome na Coreia.
Na realidade é muito mais difícil, mas os sabores são deliciosos…
1. Comecemos por perceber a
estrutura, envolventes e alguns pontos de partida:
Para
começar, sentamo-nos todos no chão,
descalços, sem apoio para as costas. Para mim é, sem dúvida, o mais difícil
na Coreia. Ao fim de 10 minutos tenho a sensação que nunca mais vou descruzar
as pernas e que só me levanto com ajuda duma grua;
2. Os
instrumentos ao nosso dispor são: 2 pauzinhos,
uma colher e as mãos (na Coreia não há pudor em usar as mãos. O mais
importante é que a comida chegue à boca). Durante a refeição não há guardanapos;
3. O
prato individual de cada pessoa é uma
taça de arroz, empapado e sem sal. Assim mesmo. E explico: o empapado ajuda
a ser comido com pauzinhos (imaginemos a fome com que ficaríamos se o arroz
fosse soltinho) e o arroz insosso serve para balançar o salgado que iremos
encontrar no resto da refeição;
4. A
sopa, ao lado do arroz, come-se durante toda a refeição. A Bia em Portugal ficou
muito chorosa quando, num restaurante, lhe tiraram a sopa porque já estava a
comer a carne. Choque cultural;
5. Existe
um prato principal da refeição, que pode ser sopa, carne, peixe ou vegetais. No geral há muito pouca carne na
refeição coreana. A não ser que o menu seja entremeada, ou intestino. Aí é
carne até aos olhos…;
6. E
depois há muitos pratos no centro da mesa com uma variedade ilimitada de
ingredientes. Quase todos picantes e
alguns muito picantes, que pegam fogo desde os olhos até ao estômago (e
olhem que eu sou apreciador de picante!). Todas as pessoas se podem servir de
todos esses pratos, usando os
pauzinhos individuais;
7. Pode
haver molhos, onde se irá mergulhar a comida antes de levar à boca. Quase todos
os molhos são picantes…
8. O
volume da comida costuma ser superior à soma de todos os estômagos, ou seja, sobra sempre comida. Este é um hábito
Coreano que ainda faz confusão à minha mente Europeia e à minha educação! O que
vale é que em casa a comida guarda-se para próximas refeições. Nos restaurantes
há um desperdício chocante de comida;
9. Nos
restaurantes ou em casa, para algumas ementas, parte da refeição pode ser cozinhada na própria mesa. É um ritual muito
interessante, pois o cozinhar introduz a socialização na ementa, com todos
sentados à mesma mesa;
10. Para
acompanhar, as bebidas. Os coreanos no geral bebem bastante. Dá um empurrão importante para romper a
bolha da timidez asiática. Emergindo dum silêncio cerimonioso, riem-se,
cantam e abraçam…
Principais opções
das bebidas alcoólicas:
cerveja (5%)
Soju (20%)
Makolé (6%)
De um modo geral as refeições de
cada um são uma espécie de “menu à medida”. Cada um escolhe o que quer comer, dos
vários pratos dispostos na mesa.
Recapitulando…
Desagregando a mesa principal, a
área de acção de cada pessoa é isto: arroz como prato principal, sopa a
acompanhar, prato principal da refeição e diversos pratinhos.
Sintam-se servidos. Agora que já conhecem os cantos à mesa, vamos
comer…
Podemos ir escolhendo comida dos
pratos que quisermos, buscando os nossos sabores preferidos. A sopa segue-nos
do princípio ao fim. Quando o arroz termina, termina também a refeição. A não
ser que se queira servir mais arroz e continuar.
O ritmo é alucinante e os pauzinhos não param. Geralmente não se
fala muito durante a refeição. As conversas ficam para quando se terminar a
comida, acompanhadas apenas de bebida. Quando se está no restaurante existe um
botão na mesa, para chamar o empregado de mesa e não desperdiçar energia com
mimicas variadas para obter a atenção desejada.
Alguns empregados de mesa não andam. Correm!
Das primeiras vezes que comi com
a família Coreana, sempre que pousava os pauzinhos, perguntavam-me (através da
Yumi, evidentemente) se eu não estava a gostar da refeição. Eu dizia (através
da Yumi, evidentemente) que estava a fazer uma pausa para mastigar, para
apreciar sabores e respirar. Nunca mais
esquecerei o olhar da anciã na mesa: “estranhas manias, este Europeu”, deve ter
pensado ela.
Quando dois braços precisam de se cruzar para ir buscar
comida na mesa, não há tempo para diplomacias e prioridades. Criam-se níveis de
alcance onde, geralmente quem vai ao prato mais longe fica por cima…e a
refeição contínua, sem interrupções, sem necessidade de controlo aéreo.
À medida que segue a refeição,
vamos picando dos vários pratos, bebericando a cerveja e degustando a sopa.
Quando o nariz pinga e o suor escorre já é tarde para perceber qual o prato picante na mesa, ou qual deles
é mais picante, pois quase todos o são, sendo que a cor vermelha geralmente
é um bom indicador. Os olhos ardem, mas não há tempo a perder. Toda a gente manuseia
os pauzinhos num bailado em andamento allegro
com o objectivo de exterminar a comida. Devemos acelerar a respiração para
compensar a acção do picante no corpo e continuar.
É que tanto quanto já vi, os
Coreanos praticamente não mastigam. Duas ou três trincadelas e engolem,
enquanto os pauzinhos já foram buscar mais comida. Ininterruptamente até o
disjuntor estomacal disser “estou cheio, pára” e abandonam os pauzinhos.
No final a mesa parece um recinto
em fim de festival, contando a história do êxtase que se viveu…
Bom apetite
8 comentários:
muito fixe
André, até fiquei cheia ;-)
então o truque é não largar os pauzinhos e ir picando de tudo...
Tenho fome, porra
ehehe, tão bom!
Dynamic food culture😋
que speed alimentar!! mas muito booooooooooooom e saboroso.
Pare de anestesiar a dor. Cure-se!
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