*acontecimentos
pré-pandemia
No final da missão de
trabalho avisam-nos que fomos convidados para um almoço tardio com a Rainha.
“Com a Rainha?”, admiro-me eu, “Como se almoça com uma Rainha? Não tenho roupa
apropriada…”.
Estávamos no mato, no coração
da Zambézia, onde se sente que a vegetação renova o ar, o calor vem do chão e
com qualquer chuva as plantas parecem saltar, tal é a velocidade com que
crescem.
Dirigimo-nos aos
aposentos da Rainha. Estava ansioso para a conhecer, pois não é
todos os dias que se vê uma Rainha ao vivo.
Vemos na mesa alguns dos
produtos locais, numa espécie de oferenda aos visitantes. E nós, que trazíamos?
Mostram-nos igualmente a apanha desse dia: folhas e flores de quiabo. Os meus olhos brilham, pensando que vou experimentar tal iguaria, mas logo anulam o meu entusiasmo dizendo que se trata do jantar da Rainha. “Demora a preparar”, informam-me…
A nossa mesa é
delicadamente preparada, com uma toalha que parecia esperar por visitantes para
sair da prateleira. O “palácio” da Rainha tem uma palhota muito acolhedora, com
um telhado de colmo que nos resguarda do implacável sol. É servido xima, caril
de frango e malagueta fresca ainda agarrada aos ramos colhidos, para consumir
em função do gosto por piri-piri.
Talheres de prata? Não
há…uf…tinha dúvidas se saberia usar talheres requintados e guardanapos
bordados. Descartadas as mordomias, come-se com a mão direita, fazendo uma
bolinha de xima, que depois se mergulha no molho. Absolutamente delicioso.
No final da refeição, a
sobremesa. Cana-de-açúcar e a primeira produção de aguardente de cana-de-açúcar
do ano: a primeirinha! Vem
disfarçada numa garrafa de cerveja, sem rótulo, omitindo qualquer ingrediente
extra e sem necessidade de anunciar o grau de álcool. Tem que se ir mastigando
a aguardente e percebendo o nível de álcool com base na conversa que vai tendo
com o corpo.
A primeirinha é servida pela própria Rainha, a líder da comunidade
local, cuja realeza se evidencia na sua generosidade. Com um sorriso enorme agradece
a iniciativa de cadastro de terras que estamos a fazer na sua aldeia,
conhecendo e valorizando a importância do trabalho.
Bebo alguns copos. É
doce, leve e perfumada. O meu corpo conversou bem com a primeirinha. No regresso ao alojamento sinto uma enorme sonolência,
uma rendição do corpo à sabedoria da primeirinha.
Fundo-me com a cama às 17h30 e só acordo 12 horas depois…reconstruído…
2 comentários:
André, efectivamente tu és muito sortudo. Por cá, no máxim,o cantamos os reis (;D)
beijinhos com amizade.
AP
Muito bom! Chamam-lhe mesmo rainha ou foste tu que inventaste?
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