No verão, o destino mais
apetecido e concorrido são as praias, é certo. Nós somos a prova disso também,
pois o mar sempre foi uma paixão. No entanto, este ano, para variar, mudamos a agulha da nossa bússola e rumamos ao interior de Moçambique.
Ficou a nossa expectativa sobre
se seria a decisão acertada. Ficou no ar alguma estranheza das pessoas a quem
íamos contando “para o mato com este calor?”. Sim!
Um interior a escassos 200 km do
mar, mas com um cenário completamente distinto. Um cenário com mosquitos
(malária), crocodilos, cobras, escorpiões, enfim…um cenário à partida
assustador, mas que não nos desmoralizou. O resultado foi: uma bela viagem para
recordar.
Na boa (e remota) África tudo
começa com uma picada de terra batida, terra vermelha e vegetação verde (mesmo
com pouca chuva). Um calor que não vem só de cima, mas emana também do chão. Um
calor silencioso…
A Serra Choa, a proteger
Catandica, com uma altitude máxima de 1600 metros, já marca diferença estando
lá em cima. Nuvens cinzentas mais perto, a construir um cenário mutante que nos
convence que é a primeira e última vez que o vemos. Chamam-lhe a Suíça de
África, e pelo que percebo é pelo verde que resiste à seca, que mina a
agricultura lá em baixo. Mas cá em cima, húmido, fresco, as plantas
correspondem e as vaquinhas acompanham.
Um pique nique com vista
privilegiada. A logística simples mas eficaz, gerida por um sul-africano,
claro, que esta rapaziada é mestre na arte do camping e do braii.
No alto da montanha fomos
encontrar uma herdade de mil hectares, mas apenas 200 estão plantados. Mesmo
assim, há árvores de macadâmia até ao horizonte. A 30 km da estrada principal,
aqui produz-se a sério.
Em Catandica, a caminho de Tete,
visitamos a quinta da D. Ilda. Uma portuguesa a viver em Moçambique há mais de
50 anos, mas com um sotaque nortenho cristalino. Nem uma variação. Admirável. (Eu
estou cá há seis, e já não sei a origem do meu sotaque!). Gere uma quinta de
agricultura e animais. Foi daqui que levámos o leitão para assar no fim de ano.
À boa moda nortenha: “vós quereis um leitãozinho?”
Os cabritos selvagens, estão aqui
como animais domésticos. Ainda tímidos, sempre temos a oportunidade de os ver
mais de perto.
Para combater as variações de
água (calcanhar de Aquiles da agricultura), aqui construiu-se uma barragem
caseira. Com uma albufeira considerável, no sopé da serra Choa.
Foi aqui que passamos um belo
dia, entre pesca e passeios de barco, num cenário “que nem parece Moçambique”.
Desculpem-me o parêntese, mas a expressão “que nem parece Moçambique”, num país
8 vezes maior que Portugal, é de quem desconhece. Moçambique é enorme e tem
locais lindíssimos (tenho a sorte de conhecer alguns). Os locais estão lá,
muitas vezes longe, escondidos, à espera duma foto…
Depois duma estrada poeirenta, a
estação de comboios é uma surpresa! Impecavelmente pintada, limpa, mas sem
passageiros. Parecia nova e exposta numa galeria isolada da acção do pó. Apenas
guardiões que inventam desculpas para sacar algum dinheiro. O argumento deles
era que não se podia tirar fotos à estação. “Meu senhor, uma estação tão linda,
tem que ser fotografada, e mostrada ao mundo!“ – disse eu.
Aqui custa a acreditar que passe
algum comboio, mas dizem que passa. Deve ser é numa frequência suficiente para
o cabrito deambular à procura de refeição.
A estalagem também está impecavelmente
pintada. Uma cor de gosto mais discutível, mas apresentável. O café parecia
mobilado como nos anos 60. O tempo ali não entrou para beber nada. Sentamo-nos
e pedimos algo simples: um pão para a Bia e 3 cafés. O empregado retorna, com
ar profissional e diz: “não temos café!”. Dizer o quê? Não tem, não tem…
Safou-nos o pão para entreter a Bia.
Algumas pontes são feitas a
braços da população, por necessidade. Fiável até para passar um carro,
atravessamos sobre o rio Nhazónia. Rio onde todos tomam banho, lavam roupa,
bebem, dão aos animais…enfim, uma vivência comunitária.
O problema é que muitos dos rios
estão empestados de bilharziose. Apesar do calor e do apetecível banho, não
arriscamos entrar.
A
barragem da Chicamba, com nome antigo de “barragem Oliveira Salazar”, tem o seu
devido peso no abastecimento de energia elétrica nas províncias de Manica e
Sofala.
Ainda resistente, recebe agora
obras de manutenção/ampliação que vai permitir, juntamente com a barragem de
Mavuzi, produzir 80 MW de energia.
A albufeira, com uma cota a
variar entre os 100 e os 700 metros, comprova a seca que se vive no sul de
Moçambique. Moçambique é tão vasto que vivemos, no mesmo país, dois dos maiores
efeitos das alterações climáticas ao mesmo tempo. No norte contabilizam-se os
estragos das cheias e no sul, as nuvens insistem em dar-nos chuva a conta-gotas!
Remoto não é sinal de isolado ou
abandonado, e muito menos de passar fome. O menu nunca vacilou. A seia de Natal
foi servida com uma perna de impala e outra de porco, assadas durante 3 horas…
É na fogueira da noite que se
aquecem as palmas dos pés. É na fogueira da noite que ficamos hipnotizados com
o fogo. É na fogueira da noite que abrimos o coração na conversa. É na fogueira
da noite que se contam histórias para recordar.
A Quinta de Chuala…foi onde pernoitamos,
sem rede de telemóvel, rodeado de natureza e bicharada! Para contar num próximo
post...
6 comentários:
Xuxa,
Belas paisagens (como sempre)!
Abraco :)
I told you! Let s go there!:) xx
sem palavras...que bonito.
quando é a apanha da macadamia? bora lá!
Fico sempre com vontade de pegar e arrancar à procura de experiências assim. Que paisagens e histórias espetaculares. Fico a aguardar a continuação da aventura.
Estive acampado nas terras da estalagem com os escoteiros da Beira do bairro da Ponta-Gea em 1967... Que lugar lindo!...Lembro até hoje.
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